Menu
Deficiência Auditiva / Fonoaudiologia

Aquisição de Linguagem Oral pela criança surda

Aquisição de Linguagem Oral pela criança surda : qual o papel que a família e a escola desempenham nesse processo? Na minha opinião, ambas têm papel fundamental, e foi por isso que encomendei este post à fonoaudióloga Mônica Campello.

“Sendo um universo que sempre me fascinou desde a infância marcada pelo convívio frequente, a Fonoaudiologia foi o caminho que encontrei para estar mais próxima dos meus amigos surdos e promover o contato entre nós através da língua portuguesa. Relevando o lado polêmico que o aprendizado da língua portuguesa oral por surdos muitas vezes evoca, me emociona e sou tomada por uma alegria recompensadora quando crianças surdas que atendo começam a emitir, com propriedade, suas primeiras palavras.

Sabemos que os primeiros dois anos de uma criança são um período de audição passiva; um período de escuta, onde ela conhece e compreende uma língua para então poder emiti-la. A criança surda, de uma maneira geral, a partir do momento que faz uso do Aparelho de Amplificação Sonora Individual (AASI) ou a do Implante Coclear (IC), precisa também passar por esse período de escuta, por meio da tecnologia, para começar aprender a se expressar oralmente, também.

Português ou Libras?

É necessário esclarecer que aprender a Língua Portuguesa oral não impossibilita o aprendizado da Língua Brasileira de Sinais (Libras) ou vice versa. Por isso ressalvo o também (ou seja as duas línguas, sinais e oral). A partir do momento que temos essa compreensão que são duas línguas distintas e que podem fazer parte da realidade de muitas pessoas surdas, o aprendizado sendo o mais precoce possível, se torna real e pode acontecer. Bem, mas também temos conhecimento de casos onde por algum motivo, a linguagem oral pode não se desenvolver ou se desenvolver aquém do esperado, mas essa é uma outra conversa.

Hoje, aqui, neste espaço, vamos falar sobre a linguagem oral e como os pais e a escola desempenham papéis importantes para que ela comece a acontecer no dia a dia do convívio familiar, escolar e terapêutico

Levando em consideração que em apenas aproximadamente 3% do tempo a criança está em terapia, enquanto passa 97% do seu tempo com a família e na escola, temos que sensibilizar os pais e/ou responsáveis sobre a importância de terem atitude de escuta cultivando, neles e na criança, o hábito de promover percepção auditiva em situações do dia a dia em seus lares e na escola.

Desenvolver as habilidades mentais superiores para obter conhecimento sobre o mundo só é possível a partir do momento que vivenciamos situações naturais, para que possamos desenvolvê-las a partir da experiência vivida. Com isso, vamos dar atenção e maximizar a função auditiva, que surge a partir do momento que a criança é exposta ao mundo sonoro, fazendo com que por meio da tecnologia a criança aprenda a escutar e a falar.

A criança deve ser estimulada o quanto antes na descoberta de que ter acesso ao mundo sonoro, dentro de suas possibilidades fisiológicas, pode lhe dar prazer e para isso é necessário que use constantemente seu dispositivo eletrônico, só o tirando para tomar banho ou dormir, para que a escuta aconteça preparando-a para emissão de suas primeiras palavras.

O ambiente escolar e familiar

O ambiente familiar e escolar são tão ricos de recursos e situações de escuta que devemos aproveitar sempre as oportunidades que surgirem para que ela aconteça. A criança irá aprender, por exemplo, por meio de analogias; olhando, comparando, relacionando e associando, sendo que o processo cognitivo  afeta como ouvimos e a forma como qual ouvimos afetará todo esse conhecimento. Ao falarmos com a criança surda devemos sempre oferecer pistas visuais para que se torne mais fácil o entendimento por ela sobre o assunto que estamos falando.

Em casa ou na escola temos infinitas possibilidades no dia a dia para que a linguagem compreensiva e expressiva aconteça, como exemplifico a seguir:

No ambiente familiar No ambiente escolar

É o som do telefone, uma batida na porta ou até mesmo um preparo do café da manhã.

Quanto de escuta e compreensão acontecem nesses momentos. Lembre-se que tudo que parece muito natural para nós, ouvintes, é sempre uma novidade para nossa criança surda.

Combinar previamente com os familiares e todos que chegam para uma visita que devem tocar a campainha, mas também bater na porta é um recurso. Pegar a criança no colo ou pela mão direcionando sua atenção para o som e contextualizando a escuta complementa essa vivência:

– Ouve o barulho? papapa (reproduzindo com a mão o bater na porta)…é a alguém batendo à porta. Vamos abrir? Ouve ding dong…é alguém tocando a campainha ? Vamos abrir ?

– Ahhh é a vovó !!!!! Oi, vovó !!! Você chegou !!!! Vamos dar um beijo na vovó?

Lembrando sempre da importância também da leitura de fala para melhor compreensão da escuta e da linguagem.

O ambiente escolar é rico de sons e linguagem. A criança da pré-escola irá aprender as regras de convívio e sempre de forma lúdica e apropriada para desenvolver sua compreensão da linguagem, seja na hora da chamadinha, ou na hora do Clima Tempo.

É importante que previamente a Fonoaudióloga e a família conversem com os profissionais da escola explicando sobre o manuseio do recurso tecnológico, sobre o ganho que ele traz, de como a criança deverá sentar nas rodinhas de conversa ou durante a hora da historia ou de alguma outra atividade. Essa aproximação fonoaudióloga, família e escola é essencial para o bom desenvolvimento da escuta e posteriormente da fala.

– Como está o tempo hoje ? Está sol (mostrando a gravura de um sol) ou está chovendo ( mostrando outra gravura). A criança surda é muito visual e precisa desse recurso também para melhor compreensão da escuta.

– Isso está sol !! Está quente ! Nossa ! Está calor !! E sempre acompanhado de gestos naturais daqueles que fazemos sempre nas brincadeiras com as crianças, sendo abanando o rosto/pescoço com as mãos ao emitir calor ou soprando para a mesma dramatização. A escuta, a leitura de fala e a dramatização farão com que a criança compreenda melhor toda situação vivenciada para que depois possa também reproduzir oralmente durante outra oportunidade.

A aprendizagem deve ser gostosa

É importante lembrarmos que toda experiência de aprendizagem deve ser gostosa, agradável e trazer diversão à criança. Quanto mais a criança participar ativamente de vivências prazerosas, mais aprendizado acontecerá. E durante essas brincadeiras e atividades devemos estimular sempre sua produção verbal ou repetição (exemplo): Olha, a Vovó chegou !!! Oi Vovó ! Vovó! …de forma a encorajar essa produção oral que inicialmente poderá não ser tão perfeita, mas que com certeza será modulada permitindo-nos constatar que o input auditivo estará acontecendo.

Nas fases mais precoces nossa fala com a criança deve ser bem melodiosa e quando o bebê começar a balbuciar, os pais podem repetir esse balbucio adicionando novos sons, pois dessa forma estará oportunizando a criança ouvir também sons diferentes daqueles que começa a produzir.

A criança surda mais nova que atendo, agora com um ano e sete meses, com perda neurosensorial profunda bilateral, aguardando cirurgia de implante coclear, iniciou atendimento precoce logo após o diagnóstico, quando também iniciou o processo de adaptação de seus Aparelhos de Amplificação Sonora Individual (AASI). Suas vocalizações estão cada vez mais ricas com fonemas diversos e ela já utiliza algumas produções orais melódicas contextualizadas para nos fazer entender seus desejos.

Ao ver um cachorro o identifica vocalizando o “au au”;  ao querer alguém  perto dela, emite também chamando com suas pequenas mãozinhas ! (v)em ! (v)em ! e  essa comunicação nos encanta. Os pais participam dos atendimentos. No primeiro contato com a escola conversamos durante duas horas com os profissionais e os pais sempre trazem novidades observadas em casa, vez ou outra acompanhada de um vídeo para ilustrar. Parceria total! Com certeza seu prognóstico é de sucesso, pelo comprometimento que pudemos observar de todos que a cercam e pelas vocalizações que a tornam cada vez mais tagarela.

Todo esse trabalho direcionado para o desenvolvimento da fala é muito rico, sendo que para que aconteça é necessário que a criança seja, o mais brevemente possível, exposta a linguagem oral. A cognição, a linguagem, a fala e as funções comunicativas e habilidades conversacionais devem ser desenvolvidas por meio de um trabalho sistemático voltado para as habilidades auditivas e com a parceria importante e fundamental da família e da escola. Ah, cercado também de muito amor e certeza de que a criança surda é – sim – capaz de ganhar o mundo se comunicando e se fazendo entender por todos nós. Lembrando que este destaque é para as possibilidades de desenvolvimento de linguagem oral.

Beijos e até a próxima!”

Fonoaudióloga Mônica Azevedo de Carvalho Campello

Professora e Fonoaudióloga do Instituto Nacional de Educação de Surdos (INES)

Membro do Grupo de Estudos e Pesquisa sobre a Surdez (GEPeSS-UFRJ)

Grupo SURDOS QUE OUVEM

Você se sente sozinho? Solitário? Não tem com quem conversar sobre a sua surdez? Gostaria de tirar mil dúvidas sobre os seus aparelhos auditivos? Gostaria de conversar com pessoas que já usam implante coclear há bastante tempo? Precisa de indicação de otorrino especializado em surdez e fonoaudiólogo de confiança?

Somos 22.000 pessoas com algum grau de deficiência auditiva no Grupo SURDOS QUE OUVEM. Para ganhar acesso a ele, basta se tornar Apoiador Mensal do Crônicas da Surdez a partir de R$5.





NOSSAS REDES SOCIAIS

LIVROS CRÔNICAS DA SURDEZ

Neste link você encontra os seguintes livros:

  1. Crônicas da Surdez: Aparelhos Auditivos
  2. Crônicas da Surdez: Implante Coclear
  3. Saia do Armário da Surdez

RECEBA NOSSAS NOVIDADES NO SEU EMAIL

Clique aqui para receber.

About Author

Paula Pfeifer é uma surda que ouve com dois implantes cocleares. Ela é autora dos livros Crônicas da Surdez, Novas Crônicas da Surdez e Saia do Armário da Surdez e lidera a maior comunidade digital do Brasil de pessoas com perda auditiva que são usuárias de próteses auditivas.

3 Comments

  • Helio Facchinetti
    05/03/2018 at 11:21

    Estou comprando tudo que preciso de acessorios na Sonora web, empresa séria e competente. Paravse ter uma idéia, o deumidificador elétrico q na loja onde comprei os meus aparelhos está por $ 700,00 comprei por $ 369,00

    Reply
  • noemia duarte chagas
    13/11/2017 at 15:11

    ok e quando a criança surda de grau severo tem o nervo auditivo lesado e não adianta usar aparelho e não pode fazer o implante coclear ? quem é que vai treinar para a leitura labial?

    Reply
    • Monica Campello
      17/11/2017 at 08:51

      Oi Noemia, tudo bem? Respondendo a sua pergunta no que se refere a quem vai treinar a leitura de fala – a leitura labial – também será a Fonoaudióloga que assiste a criança. Desenvolvendo estratégias diversas e utilizando metodologias,aqui explicando de uma forma geral. Se faz necessário que a profissional conheça bem a história dessa perda auditiva, que converse com o médico otorrino que a acompanhe e que ela atue também junto a família e a escola para que essa leitura se desenvolva. Espero ter te ajudado. Beijinho !

      Reply

Deixe um comentário para noemia duarte chagas Cancel Reply

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.