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Pelos poderes da vida amorosa, como é difícil. 90% do que diz respeito ao flerte, xaveco, ou chamem como bem entender, acontece no escuro. Baladas escuras, bares escuros, restaurantes com a luz tão fraca que mais parece que você está jantando na caverna do Zyah lá na Capadócia – é assim que os sinos tocam. Dureza. Ou melhor, dureza para quem não escuta. Esses dias fui numa festa que era a literal visão do inferno para nós. Cheguei a pensar que tinha sido convidada para uma convenção de fãs do Crepúsculo – da ala dos vampiros, claro. Imaginem a cena: noite de céu estrelado, música a todo volume, dezenas de pessoas falando, nenhuma luz acesa e, a cereja no topo do bolo, uma máquina de fumaça glamourizando os poucos raios de luz que saíam de uma TV ligada. Emocionante, hein? Encontrei um antigo colega de colégio por lá e, adivinhem! Veio falar comigo diretamente ao pé do meu ouvido. O jeito foi, só pra variar, concordar com tudo. Afinal, a outra opção era dar um berro de “Vaaaamo acender a luz, pessoallll” e, pelo óbvio, me expulsariam da festa. Que momento!!

Será que os ouvintes não gostam de luz? Porque tudo precisa ser no escurinho, meldels? É charme? Tática de guerra? Improviso? Freud explica? Fico só observando os flertes entre duas pessoas que ouvem no escuro e, convenhamos, a única coisa que ambas não fazem é se olhar nos olhos. Um fala ao pé do ouvido olhando pro teto, o outro responde ao pé do ouvido olhando pra porta. Olho-no-olho que é bom, nécas. Eu, hein. Não é tão sexy quanto supostamente deveria parecer. Sou mil vezes mais um olhar do que um sussurro. Enfim.

Por isso, eu peço: PELO FLERTE À LUZ DO DIA

Não deixe seu/sua paquera com dificuldades auditivas em apuros, prestes a ter uma súbita síndrome do pânico de tanto nervoso. Não flerte no escuro, não fale ao pé do ouvido, não leve a lugares barulhentos, não espere que a pessoa faça milagres. Por favor! Um pouco de compaixão, de neurônios funcionando, de sensibilidade. Não custa nada. Não me exija mais do que sou capaz de dar, meu bem, ou você ficará a ver navios.

Eu sei, você sabe, nós estamos carecas de saber que as pessoas que ouvem não são capazes de fazer a mínima idéia dos perrengues que passamos. Já pensou que louco ter um ataque de sinceridade e dizer pro paquera: “Olha, meu filho, num primeiro momento, não estou interessada na sua personalidade, talentos, dotes ou a PQP. Estou interessada em compreender a sua boca. Só isso!”. O resto é o resto, vem depois, vem com o tempo. Mas a boca precisa fazer sentido, senão, nada feito. O movimento dos lábios deve ser compreensível com som, sem som, com aparelhos auditivos, sem eles. Sem isso não há história de amor que resista. Pelo menos, no meu caso.

About Author

Paula Pfeifer é uma surda que ouve com dois implantes cocleares. Ela é autora dos livros Crônicas da Surdez, Novas Crônicas da Surdez e Saia do Armário da Surdez e lidera a maior comunidade digital do Brasil de pessoas com perda auditiva que são usuárias de próteses auditivas.

17 Comments

  • Natalyê
    14/05/2013 at 18:13

    Hehe
    Você escreve muito bem! Parabéns!

    Olha, sou ouvinte, mas também sou a favor do “Flerte à luz do dia”
    Nada como olhar nos olhos. A escuridão pode esconder muitas verdades…

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  • Margarete Fernandes
    22/04/2013 at 12:38

    Você esqueceu de falar nos bigodes kkkkk como atrapalham a leitura labial!!!! kkkkk A gente tem que ter muuuuuuito bom humor, mesmo!

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  • Margarete Fernandes
    22/04/2013 at 12:36

    kkkkkkkkkkkk, excelente!

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  • Fábio R. Duarte
    12/04/2013 at 10:32

    Muito legal o texto, gostei muito.
    Não sou muito fã de lugares assim, penso que para se conhecer melhor uma pessoal não é o ideal, o excesso de barulho,a penumbra e por ai vai, muito pouca informação você vai assimilar,vai estar mais interessado no físico do que propriamente em conhecer a pessoa em si.
    Beijão e bom fim de semana!

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  • Eliana Cascaes Correia
    11/04/2013 at 15:22

    Concordo em gênero, número e grau.
    Tão bom poder ler os lábios…ver, ver e ver a boca!

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  • Janine
    11/04/2013 at 12:26

    hahahaha
    Fiquei lendo e imaginando..
    Pior que é bem assim. Detesto lugares barulhento e prefiro mil vezes um barzinho iluminado.
    Meu noivo as vezes quer conversar ao pé do ouvido e eu fico sem jeito,pois nem sempre escuto o que ele diz, mas entendo pela expressão corporal.
    O que? hãã? Não entendi! Já fazem parte

    Eu e minha irmã temos perda auditiva, a minha irmã tem severa e a minha esta leve, futuramente vamos precisar de aparelhos.
    Acompanho teu blog, acho suuper legal, inclusive no dia do lançamento do livro não pudemos comparecer, era o aniver da nossa vó. Mas já temos o nosso livro.

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  • Maria Inês
    11/04/2013 at 09:19

    Muito bom!

    Reply
  • Rafael
    10/04/2013 at 17:24

    Que engraçado o post, relembrei de algumas situações da minha vida.

    Sempre prefiro o olho no olho do que a conversinha ao pé de ouvido, mas se local escuro, barulheira e pé de ouvido é o que tem, então… vai! hehehe
    O lance é ver os sinais, tentar identificá-los na linguagem corporal mesmo. Várias vezes dá para notar que a(o) outra(o) tá a fim, então é só ter coragem, uma pitada de cara de pau para interpretar “a favor” e o resto… já sabemos. Qualquer coisa fora do plano é só esclarecer como um mal entendido, afinal… não *vi* você falar. rsrs

    É por aí, com leveza e na boa; se rolar, rolou…
    Mas se a paquera é veterana, digamos – já um segundo encontro, aí vale abrir logo o jogo e pedir por um local mais claro mesmo sabendo que isso possa mudar o tipo de balada que programaram… quem está a fim da companhia e quer conversar, aceita sem problemas.

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  • Cinara Mota
    10/04/2013 at 08:57

    Acredita que já perguntei aos meus amigos qual é esta neura de ter a maioria dos lugares escuros e deixando uma pessoa como eu mais perdida que rato em labirinto.
    DIZEM eles que isso é parte do jogo pois como tem muita gente que fica em um clima meio sensual até demais, menos luz ajuda eles disfarçarem. Convenhamos, se ficou sensual.. vá pra um quarto né?

    Eu meio que criei uma tática quando estou na balada ou bar, ou festa que é meio escura. Invento que tá difícil ouvir (nesta hora meu aparelho tá desligado, não aguento sons extremamente altos) e falo para irmos em um lugar mais calmo onde possamos conversar melhor. Na maioria das vezes isso funcionou (ainda bem) e quando não funciona, eu fico lá que nem bobona fingindo que tô entendendo o carinha!

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  • Janise
    09/04/2013 at 19:00

    É, Paula, nunca gostei de lugares com pouca iluminação e muito barulho, mesmo quando ouvinte. Ah, e hoje, implantada, nem ouso frequentar lugares assim. Diante disso, acabo ficando mais na minha casa ou vou em casas de parentes e amigos. Beijos.

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  • Samira
    09/04/2013 at 11:26

    Paula, ontem mesmo falei a uma amiga do por que prefiro ir no restaurante X e não no Y. Tudo pelo conforto auditivo. E este teu post ilustra bem o ambiente acústico. O flerte e toda comunicação em local “de luz” é melhor!

    BJ grande!

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  • lucio
    09/04/2013 at 11:25

    Risos… que tragicomédia… sim, concordo com você Paula embora quase não frequente locais assim, meio escurinhos… quanto aos flertes a maioria que vivenciei ocorreram à beira de uma piscina… e eu sem os meus estimados aparelhos auditivos (que não são a prova d`água, mas isso é outra história e foge ao contexto de seu belissimo e visceral texto..

    Reply
  • Silvia
    09/04/2013 at 09:33

    Adorei, Paula!!! vou compartilhar no meu face mais tarde… tudo verdade verdadeira!!! Sufoco esses lugares escuros, nem vou mais neles…

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  • Maria
    08/04/2013 at 21:32

    Deveria ter um botão de curtir aqui! Eu queria curtir mil vezes o seu texto!

    Nunca consegui ver graça em lugares escuros e me pergunto como as pessoas podem gostar??? Ninguém consegue escutar nada e enxergar direito!!! Outro dia marquei uma reunião com antigos colegas num restaurante, escolhi a mesa com a melhor iluminação e posicionei os colegas de forma que a luz fosse favorável para mim! Não tenho vergonha de fazer isso e eu consigo aproveitar mais a ocasião!! Infelizmente o pessoal sempre gosta de ir para balada após o jantar, e eu tenho de explicar sempre porque me recuso a ir em baladas. São detalhes dos quais as pessoas nunca pararam para pensar.

    Sou como você, gosto de conversa olho por olho!

    Tenho uma outra impressão sobre os ambientes de uma festa/reunião… Nunca vi um homem amigo de algum amigo meu vir até mim pela curiosidade de eu ser surda oralizada. Todos se mantêm distantes nos cantos deles mesmo que eu esteja dentro de uma conversa grupal em alguma mesa da festa! Posso até tentar puxar assunto ou perguntar do que estão falando na conversa grupal, mas a tentativa não conseguia evoluir por pura má vontade deles de lidar com uma pessoa com dificuldade de acompanhar a conversa.

    Que pena, quem tiver mente fechada está perdendo a oportunidade de conhecer garotas bem legais! A nossa surdez acaba funcionando como uma espécie de filtro de pessoas. Eu prefiro estar só do que mal acompanhada!

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  • Magda Vagli Zobra
    08/04/2013 at 19:13

    Adorei o texto Paula, eu quando conheci meu marido era ouvinte, mas hoje em dia quando me convidam pra ir em barzinho ou lugares escuros evito e eu mesmo tendo uma familia com muitos def. auditivos parece que nem eles mesmos se preocupam se outro esta te ouvindo ou não…por isso gosto de fazer corrida de rua lá todos tem o mesmo objetivo e sempre falam a mesma lingua..bjs

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  • Daniela V. Albring
    08/04/2013 at 16:59

    Muito bom! hahahaha
    Eu acho que mesmo quem ouve bem não entende nada do que é dito em festas como essa!!!! Acho que o objetivo das pessoas não é se entender, é só observar o exterior dos outros. Achar alguém legal na noite é pra lá de complicado…!
    Eu conheci meu maridão sob muitas luzes, à noite, mas dentro de casa e entre poucos amigos, daí foi beleza!!! heheehehe
    Beijocas querida, ótima semana!!!

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