“Querida Paula,
Antes de mais nada, é um imenso privilégio poder escrever para você. Obrigada por tanta coisa que você fez e continua fazendo para desmistificar a deficiência auditiva. Minha admiração por você é eterna!! Agora, preciso te alertar que falo (escrevo) muito, e já peço desculpas pelo meu longo depoimento a seguir…
Me deparo hoje com a necessidade de renovar os meus aparelhos auditivos, pois estou um pouco insatisfeita com eles (qualidade, volume, o suporte do fornecedor, entre outros fatores). Desta forma, durante uma pesquisa por modelos, características e fabricantes, cheguei ao seu blog. Feliz coincidência! Você tem uma seção “Primeira vez no blog?” com uma simpática figura de uma xícara de café (eu adoro café!!). Me conquistou de primeira. Devorei a seção de depoimentos. Fiquei encantada com tantas lindas histórias, tantas pessoas guerreiras, tanta esperança embutida nas palavras ali escritas. Apesar de não conhecer ninguém, me identifiquei com tantas pessoas… senti no coração os sentimentos relatados, vibrei juntinho com as vitórias pessoais de cada um, me senti um pouco menos sozinha nesse imenso oceano solitário que só um deficiente entende como é. Acho que você deveria complementar a figura da xícara de café com uma caixa de lenços, é praticamente impossível não se emocionar.
Alguns meses depois, li todo o seu livro “Crônicas da Surdez” em algumas horas. No dia seguinte, devorei o “Epifanias do implante coclear”. Em poucas palavras, ler o primeiro livro foi simplesmente comovente, esclarecedor, tocante na minha alma, reconfortante para o meu espírito. Em suas folhas, há muitas mensagens positivas que desejei demais ter ouvido na minha infância e, principalmente, na minha adolescência… Em vários trechos, fiquei emocionada e tive que conter minhas lágrimas. Foi como se eu estivesse revivendo algumas partes de minha própria história.
Bom, sou a Rita – 40 e poucos anos, casada, com filhos, uso AASI´s. A minha história é muito parecida com tantas outras descritas em seu primeiro livro e no seu blog. Nasci aparentemente normal. Alguns meses depois, comecei a ter recorrentes otites e reações alérgicas aos antibióticos. Com 1 ano de idade e, após fracassadas manobras de tubos de ventilação, fui operada em São Paulo (cirurgia de mastoidectomia), tanto para conter a infecção que ameaçava os nervos auditivos, como para evitar uma surdez total. Dizem que a cirurgia foi um sucesso. Sinceramente, não sei avaliar. Isso é tudo que eu sei, pois meus pais falavam pouco sobre essas coisas. Hoje em dia, eles não se lembram muito dos detalhes.
Até os cinco anos, eu escutava mal, não falava, interagia pouco e apenas com as pessoas da família que me eram mais próximas. Curiosamente, eu tenho pouquíssimas lembranças dessa fase – é como se eu não tivesse vivido. Meus pais decidiram, então, tomar alguma atitude, embora, na minha percepção, um pouco tarde. Me levaram a médicos, fui submetida a exames, incluindo a audiometria. Na ocasião, fui diagnosticada com uma hipoacusia mista bilateral. Atualmente, o meu diagnóstico é perda auditiva bilateral, neurossensorial, grau moderadamente severo (em algumas frequências, a perda é profunda). Falaram aos meus pais: “ela é uma criança bem no limiar de ser uma completa deficiente”. Como nos anos anteriores eu não fui estimulada, me tornei uma criança tímida, muito quieta, reservada, desinteressada em treinar a audição, preguiçosa em melhorar a fala, desmotivada em desenvolver relacionamentos.
Contra a minha vontade, comecei a ter sessões de fonoaudiologia com uma senhora que foi uma verdadeira Anne Sullivan em minha vida. Não me atrevo a me comparar com Helen Keller, um ser humano extraordinário a quem admiro muito. Mas a minha Anne Sullivan não foi só uma profissional firme e competente: ela foi meu anjo, minha professora, minha psicóloga, minha irmã mais velha, minha prima, minha amiga, minha incentivadora, minha segunda mãe. Foi rude quando precisei ouvir palavras duras para amadurecer; mas também muito carinhosa nas horas que eu precisei de palavras de conforto para entender e superar as adversidades.
Meus pais sempre foram atenciosos e carinhosos comigo. Sempre procuraram proporcionar as necessidades básicas… eu os amo muito, mas preciso admitir que eles não foram meus incentivadores. Na verdade, fizeram muito pouco para que eu acreditasse em meu potencial, para que eu acreditasse que podia ser qualquer coisa em minha vida, que a deficiência só é um obstáculo, um tormento ou um pesar quando você assim o encara. Minha fonoaudióloga é quem foi essa pessoa a semear em mim os valiosos grãos da paciência, da perseverança, da luta, da vitória. Ela é quem realmente me ajudou a criar minha atual identidade.
Com ela, comecei sendo uma criança rebelde, arredia, desinteressada. Demorei para começar a gostar dela. Eu era tão cretina que eu me lembro de ir ao seu consultório, enquanto minha mãe me esperava no carro, e fingia que tocava a campainha para não ter que ir ao seu encontro. Funcionou duas vezes. Depois, ela mesma ficava na porta ou na janela me esperando…
Com grande paciência e muitos anos de convivência, ela foi fundamental no meu desenvolvimento, na formação de meu caráter e de minha resiliência. Apenas com 10 anos, eu comecei a falar de forma mais clara e inteligível. E graças a ela. Ela também me ajudou em tarefas da escola, me ensinou a tocar piano, lia vários assuntos diferentes para não só treinar minha fala, mas também para atiçar a minha curiosidade. Posso afirmar, com segurança, que ela é a grande responsável pela pessoa que sou hoje.
Há muito a contar sobre ela, mas, particularmente, gosto de relembrar uma de nossas conversas. Certa vez, me disse que tinha tido um sonho comigo: que eu estava tendo uma vida brilhante pela frente, que eu fazia faculdade, que eu me casava na igreja, que eu tinha lindos filhos… Eu falava: “Faculdade? É, duvido muito.” Na ocasião, eu me achava feia, e havia professores da minha escola que faziam questão de afirmar, na minha frente mesmo, que eu era burra. Eu não gostava de mim mesma, então duvidava muito que alguém iria gostar de mim, que eu fosse ter paixões, que eu fosse me casar, que eu pudesse, intelectualmente, chegar tão longe. Ao que ela rebatia: “Você nem imagina como você é linda, esperta e inteligente. Você não tem ideia do potencial que existe em você. Mas eu sei que você irá, em algum momento, descobri-lo. Entretanto… você precisa dos aparelhos auditivos. Sem eles, sua vida será muito difícil, será limitada, seus sonhos serão tão pequenos… Conforme o fluxo natural da vida, você sabe que seus pais não estarão sempre disponíveis para ajudá-la. Eu também não estarei aqui para sempre.” As duas últimas sentenças foram um tapa de realidade na minha cara.
Ela sempre tentava me convencer para usar os aparelhos, sem sucesso. Eu era muito resistente a usá-los… na minha cabecinha de criança, eu tinha bons motivos para isso. Faço uma pequena ressalva: esses motivos eram diferentes daqueles habituais – eram mais do que serem feios, grandes; e mais além do simples medo da rejeição. Os motivos eram outros, mais profundos e difíceis de entender. Eu mesma só pude externá-los e compreendê-los anos mais tarde. Mais uma vez, e me desculpe, mas essa é outra história que deverá ser contada em outra ocasião… Claro, hoje reconheço que realmente precisava deles desde cedo… desde a cirurgia que fiz quando bebê!
Quando cheguei na idade de 11 anos, ela teve que se mudar para outro Estado. Com emoção, ela me deixou… e, até então, apesar de todos os seus apelos, ela nunca teve a chance de me ver com aparelhos auditivos (comecei a usá-los somente com 13 anos). Ela nunca teve a oportunidade de ver como eu realmente alavanquei o meu desenvolvimento após admitir os aparelhos. E como todos os seus ensinamentos me fizeram, no longo prazo, a ser uma pessoa melhor e mais forte. Depois dela, por um breve período, tive outras fonoaudiólogas que me tratavam como se eu fosse uma criança de 2 anos. Chegavam muito perto do meu rosto, falavam ALTO, pa-u-sa-da-men-te, fingiam empatia… Não preciso nem dizer que elas duraram apenas alguns dias. Cheguei à conclusão de que não precisava mais delas e, simples assim, acabaram-se as minhas sessões de fonoaudiologia.
Não digo que não precisava de fono… talvez ainda precisasse para alguns fonemas (tenho problemas sérios quando preciso soletrar o “s”). Ressalto apenas que não precisava de profissionais insensíveis e incapazes de lidar comigo. Tenho que admitir: é difícil gostar de um novo profissional quando se teve uma formidável Anne Sullivan por muitos anos. Confesso que, até hoje, não gostei de nenhuma fonoaudióloga, nem mesmo as que trabalham para os fornecedores de aparelhos. O santo não batia. E olha que conheci muitas… Para não exagerar, confesso que amei uma só, e eu tive a chance de conhecê-la durante uma experiência de intercâmbio… mas ela era canadense. O tratamento com os deficientes no Canadá, aliás, é impecável. Tenho certeza que há ótimas fonoaudiólogas… só não tive muita sorte de encontrá-las.
Quando fiquei adulta, procurei muito pela minha única fono para dar aquele longo e forte abraço… para que ela ficasse feliz em me ver com os aparelhos; para que conhecesse o meu ótimo marido e os meus lindos filhos; para que visse, principalmente, a pessoa que eu me transformei. Mas, infelizmente, nunca mais a encontrei. Voltando aos meus cinco anos… Eu negava a deficiência auditiva, a necessidade de acompanhamento médico, a necessidade de então me esforçar muito para poder entrar no fantástico (e distante) mundo dos ouvintes. Usar aparelhos? Nem pensar. Eram grandes, barulhentos e me machucavam, além daqueles outros motivos “ocultos” que mencionei anteriormente. Eu era um pouco dentuça, tinha cabelos bem curtos e usava óculos. Me sentia uma ET quando ainda tinha que acrescentar os aparelhos. Após algumas semanas de uso, cometi um grave descuido… que ficou marcado como o ponto em que minha vida, de certa forma e simbolicamente, se estacionou.
Por imposição de meus pais, eu colocava os aparelhos quando estava aguardando o ônibus da escola. Ao chegar na classe, os tirava e os guardava em minha mochila. Lá ficavam por todo o período escolar. Ao chegar em casa, joguei a mochila num canto, no quintal… lembro direitinho que a mochila se abriu e meus cadernos, livros e os aparelhos ficaram todos espalhados pelo quintal. “Ah, depois eu arrumo”, pensei. Mas os meus cachorros os encontraram e… os mastigaram… e os aparelhos eram novinhos! Meu pai, muito zangado, me falou: “Eu não vou lhe comprar novos aparelhos. Só quando você me avisar que quer realmente usá-los”. Neste dia, eu tinha 7 anos. Voltei a pedir apenas com 13 anos. Gente, como agradeço por esta minha decisão. Reconheço que a vida se tornou muito mais fácil com eles.
Tenho muitas histórias para contar… Mas confesso algo que me deixou surpresa… Vários relatos que li afirmam coisas como: “tive muito apoio da escola”, “meus amigos me ajudaram muito”, “meus professores sempre foram solícitos”, etc. Fico feliz por essas pessoas, embora minha experiência não tenha sido assim. Por indicação médica, me fizeram repetir o Maternal e não entrei na escola na idade certa. Fiquei um ano atrasada. Nada demais, mas… nos vários anos seguintes, sendo fácil perceber que eu tinha o problema da audição, tive que lidar com as inevitáveis constatações quando eu dizia a minha idade: “você é repetente, né?” ou, pior: “qual ano você repetiu?”. Não, eu não sou repetente, eu nunca repeti um ano na escola, nunca fiquei de recuperação.
Na escola, logo na minha primeira semana, enfrentei muita rejeição. Durante toda a fase primária, enfrentei inúmeras e graves humilhações… As piores foram não as das crianças, mas as dos professores, dos educadores, até mesmo de algumas freiras do colégio que eu frequentava. Isso tudo não tinha nome na minha época, mas eu já vivenciava o bullying, felizmente hoje tão abertamente falado, discutido e combatido. Na época, eu não conseguia reagir, não conseguia me defender, não conseguia mandar o “infrator” se ferrar (literalmente falando). Hoje, consigo tranquilamente rebater com críticas, consigo impor que tenham respeito. Mas a dor da rejeição está lá dentro, sim, ela existe no meu inconsciente. As cicatrizes são ocultas, mas frágeis e eternas.
Apesar de tudo, eu consegui fazer boas amizades: algumas transitórias; outras, mais duradouras e fortes. Eu perdi algumas amizades devido às forças das circunstâncias, das peças do destino. Outras, consegui mantê-las vivas até hoje. Mas te digo: a solidão foi a minha única amiga diária e sempre presente.
Muitas vezes, eu chegava da escola em prantos. Após dizer que tinha sofrido algum tipo de constrangimento, meus pais só me diziam que meus medos e receios eram bobagem, e que eu devia apenas ignorar e retornar à escola de cabeça erguida. Hoje, vejo claramente que eles deviam ter me ensinado a compreendê-los, a enfrentá-los e a vencê-los. Não se deve ignorar as humilhações, mas rebatê-las, confrontá-las. Eu tenho filhos, e meus ensinamentos são diferentes daqueles que meus pais me passaram. Muitos discordam de mim, mas sempre digo: “se baterem em você, não hesite: bate neles também!”.
Mas como dizia Renato Russo na música Pais e Filhos: “…Você culpa seus pais por tudo… E isso é absurdo… São crianças como você...”. Acredito que meus pais simplesmente não sabiam como lidar com a situação, e estavam envolvidos com problemas bem mais graves que os meus próprios. Acredito que eles fizeram o melhor que eles acreditavam que era pra ser feito.
Como resultado, desenvolvi, ao longo de minha adolescência, uma incrível baixa autoestima, um enorme pavor de falar em público, uma enorme falta de confiança em meu potencial… entre outros sentimentos que minaram minha identidade. Foram muitos anos para eu superar. Diria que fui melhorando quando cheguei nos 30 anos.
Um determinado ano foi marcante para mim. Eu tinha 11 anos, e fiz 12 anos. Foi o primeiro ano sem a minha fonoaudióloga preferida… minhas duas melhores amigas tinham saído da escola, sendo que uma delas tinha mudado de estado… Embora eu não tivesse mudado de escola, eu estava numa turma completamente diferente, na qual eu era invisível. Alguns colegas caçoavam de minha deficiência e falavam mal de mim, mesmo quando eu estava em frente ou ao lado delas, achando que eu não entendia nada mesmo (mas eu entendia, claro, era expert em ler lábios…).
Meus pais tinham se separado, minha mãe teve um princípio de infarto, eu morava em uma nova casa. Outras boas amigas também tinham se afastado… foi uma briga boba, dessas de criança… mas elas se afastaram exatamente quando mais precisei delas. Também passei por uma perda traumática. A família toda estava um pouco fragilizada, abalada, cada um com seus infortúnios. Para mim, pessoalmente, foi um ano não só duro, mas o mais difícil da minha vida. Foi o ano que eu me isolei, fiquei estranha, fiquei muito deprimida. Tudo conspirava contra. Até atropelada eu fui, rsrs. Mas nada grave ocorreu, apenas algumas cicatrizes. Simplesmente terrível.
Mas foi este ano solitário e sombrio que eu precisei enfrentar para, então, reconhecer que eu precisava me virar. Eu não poderia sempre depender dos meus pais, da minha família, daquelas que tinham sido as minhas melhores amigas, da minha Anne Sullivan. As pessoas vêm e vão embora. Precisava muito contar comigo mesma! No ano seguinte, comecei a usar os aparelhos e mudei de escola. Comecei a viver de verdade. Minha vida mudou muito, e para melhor.
Sou frequentemente forte, mas, às vezes, choro. E quando choro, meu coração dói. Deve ser, acredito eu, a angústia de tantas lembranças que não conseguimos apagar definitivamente de nossa vida. Deve ser a raiva enrustida daqueles que me magoaram de verdade. Mas então o Sol se aproxima e eu, instintivamente, me sinto melhor, renovada e mais forte para os próximos eventos que virão. Já dizia Renato Russo: “mas é claro que o Sol vai voltar amanhã…”. Porque a vida é bela demais para ficarmos frequente ou eternamente tristes. Há pessoas cruéis, mas há também pessoas maravilhosas que nos trazem sentido à nossa vida.
Acredito que consegui, com muita luta, ir longe em minha vida. Não fui a melhor, mas fui uma boa aluna na escola, me formei engenheira numa universidade federal. Para me tornar competitiva no ambiente de trabalho, fiz uma pós-graduação na área de TI. Passei por empresas muito bacanas de se trabalhar, consegui respeito dos colegas, adquiri uma boa bagagem e experiência. Admito que, nos vários processos seletivos que participei, omiti, sim, a minha deficiência, por uma simples questão de sobrevivência. E não me arrependo. Desde criança, via nitidamente o preconceito e a discriminação nas pessoas e sabia que, se eu expusesse preliminarmente o assunto da deficiência, eu não seria admitida. Não seria nem testada. Os percalços da infância me fizeram ser mais esperta em determinadas situações.
Surgiu a oportunidade de cursar o Mestrado, e cheguei lá. Evito sempre que possível, mas enfrentei a minha fobia de falar em público várias vezes. Tenho fluência em inglês, embora precise melhorar a minha pronúncia. Fiz intercâmbio no exterior por 3 meses e me virei muito bem sozinha. Por opção a uma vida com mais qualidade, parti para os concursos públicos, e hoje sou servidora federal. E ainda tenho tantos sonhos!
Não tenho vergonha de minha deficiência: prendo os cabelos quando tenho vontade, falo tranquilamente sobre o assunto quando as pessoas perguntam e sou, no mínimo, bem curta e grossa quando qualquer pessoa tenta fazer graça da situação. Não admito passar por nenhum constrangimento.
Enfim, as dificuldades e os traumas são ruins, mas colaboram para termos habilidades, para nos tornarmos mais fortes e para transformar a nossa história em uma narrativa de triunfo. É possível suportar a dor se acreditarmos que ela tem um propósito. Muito já foi falado e acredito que minhas palavras não são novas. Mas gostaria, humildemente, de deixar algumas mensagens àqueles que são pais, parentes, amigos, colegas de deficientes auditivos… não nos deixem no silêncio. Apenas estimulem-nos e acreditem em nós. Somos deficientes, mas somos capazes.
Considerando tudo o que eu já vivi…
1) Os sentimentos de tristeza, de negação e de luto ao descobrir que somos deficientes são normais e fazem parte da vida. Todos nós somos humanos e temos nossos momentos de fraquejo. Mas estes sentimentos negativos não podem ser eternos, por favor. E vocês devem tentar não lamentar na nossa frente, de forma frequente. Isso mina nossa frágil autoestima.
2) Sabemos que vocês nos amam. O amor é incondicional. Então, aceitem-nos, mesmo que possa levar um certo tempo.
3) Sejam fortes. Precisamos que nos ensinem a sermos fortes também.
4) Não acreditem em todos os profissionais. São humanos como nós e, às vezes, eles são ou preconceituosos ou podem estar errados. Sempre que possível, escutem uma segunda ou milésima opinião. Meus pais foram orientados a me colocarem imediatamente em uma escola de surdos-mudos. Felizmente, eles alegaram que iam, ao menos, tentar a escola normal. E deu certo, apesar de tudo.
5) Aos pais, em especial: Acompanhem a nossa evolução na escola. Conheçam os educadores, os diretores, os professores. Digam a eles, sempre, sobre a nossa deficiência. Mudou o ano? Falem de novo, pois são outros professores. Estejam atentos aos nossos sinais de desesperança, de uma triste quietude, de irritabilidade, de choro fácil, de explosões de raiva. Nem sempre iremos relatar as dificuldades, às vezes simplesmente não conseguimos falar sobre isso porque dói muito. Eu, pessoalmente, sofri muito bullying e meus pais não perceberam. Foram saber de histórias minhas somente anos mais tarde, e ainda me culparam porque eu não as mencionei para que eles tomassem alguma providência.
6) As outras crianças, às vezes, são cruéis, mas saibam que os professores podem ser mais, muito mais. Vale a mesma dica com relação aos profissionais médicos: nem sempre os professores/ educadores estão certos. Já falaram aos meus pais que eu era uma criança com problema de comportamento. Na verdade, foram os maus professores que moldaram o meu comportamento.
7) Nos dêem tempo na nossa fase de negação, mas não demais. Sejam pacientes, mas sejam também agentes de nossa mudança, facam com que saiamos da zona de conforto. Eu saí da negação só com 13 anos e somente através de minha própria iniciativa, mas adoraria que meus pais tivessem tentado, de forma mais incisiva.
8) Estimulem-nos. Façam-nos enfrentar a realidade lá fora. Não nos escondam do mundo externo, pois este, inevitavelmente, mais cedo ou mais tarde, irá nos atingir. Eu fiz aulas de danças, estudei inglês, fiz intercâmbio, fui além da faculdade… mesmo quando meus pais não me incentivaram ou não acreditaram que eu seria capaz. Meu próprio pai me perguntou: “Tem certeza de que vai fazer o Mestrado?”.
9) Digam sempre a verdade. Foi doloroso quando descobri algumas mentiras que meus pais me contaram.
10) Tenham paciência. Ouçam o que temos a dizer. Pratiquem a empatia, entendam o nosso contexto, se coloquem em nosso lugar.
11) Não critique ou despreze os nossos sentimentos. Já é dificil externá-los, e fica ainda mais difícil quando ouvimos “Mas isso é uma grande bobagem!”. Não, não é bobagem. É genuíno.
12) Palavras de carinho são tão importantes quanto as palavras duras que, às vezes, precisamos ouvir.
13) Acreditem em nós. Nos apoiem para que possamos ir além de nosso potencial.
14) Enfim, sejam os nossos mais fervorosos e dedicados anjos. É tudo que precisamos. Para que possamos, então, compartilharmos ao mundo as nossas vitórias.
Um grande beijo no seu coração, Paula, e no de todos os leitores e frequentadores do blog.
18 Comments
Renata
28/08/2015 at 02:17Amei sua história, Rita!
Temos muito em comum! Parabéns, você é uma vitoriosa!
Grande beijo ?
Herminia Piasente
21/08/2015 at 00:42Olá Rita! Tudo bem? Sou mãe de um menino com deficiência auditiva. Em muitos momentos da sua história senti como se fosse a minha história. Meu filho já tem 19 anos e ainda sinto essa mesma dor no coração que você descreveu. Uma angústia que parece que vai me matar. Mas enfim, me esforço para ajudar meu filho de todas as formas, mas acho que é sempre pouco. Ele também passou por preconceito de colegas e professores, mas também teve uma fono maravilhosa Juliana Muniz que atende em Santo André – São Paulo. Sinto as vezes a tristeza dele e isso doí demais em mim. Com o seu depoimento me senti menos sozinha. Felicidades. Beijos
Elenice
30/07/2015 at 13:20Olá Rita. Adorei seu depoimento. Não tem como se emocionar como os outros depoimentos. Também me identifiquei com algumas passagens da sua história.
Até agora estou chorando. Ainda tenho dificuldades de adaptar a este mundo dos deficientes. Sou deficiente auditiva bilateral neuro sensorial. Gostaria muito poder falar inglês, como vc conseguiu? Algum curso específico? Podemos nos comunicar através de e-mail ou face? Parabéns pela sua vitória.
Rita
04/08/2015 at 09:12Sim, Elenice, podemos nos comunicar, será um prazer conhecê-la… me manda um email… rituchagm@gmail.com… bjsss
Rita
24/07/2015 at 19:53Valéria, será um prazer!! Acredita que já passei por tantos lugares e ainda não conheci, pessoalmente, nenhum deficiente como eu? Mas sempre quis encontrar alguém para dividir experiências, para diminuir esse sentimento de solidão… e achar este blog foi maravilhoso… sou uma grande fã da Paula… e já não me sinto tão sozinha… olha, meu email é rituchagm@gmail.com. Aguardo seu contato! Bjs!
Valéria Santos
24/07/2015 at 10:22Rita, me emocionei demais com seu depoimento !!!
Esta história é literalmente o espelho da minha vida,e temos muito
em comum !
Quando me deparei com este texto no blog através do Face, confesso que achei muito longo no princípio, e como estava com pressa deixei para lê-lo mais tarde com calma, e não me arrependi !
Também sou deficiente auditiva, nasci normal e perdi com 5 anos, comecei numa escola especial, mudei para outra normal e fui até me formar na faculdade.Comecei a usar aparelhos prá valer só com 17 anos
também por incentivo de uma fono maravilhosa como foi a sua ! Passei por todas as situações que você vivenciou sem tirar nem por…
É muito bom saber que existem pessoas como nós e que conseguiram vencer os desafios e percalços da vida . Mas que ainda continuam lutando contra o preconceito que infelizmente ainda existe!
Quero te conhecer ! Quero ser sua amiga ! Para trocar experiências sobre esta luta constante que vivemos ! Temos muito que conversar, pois se for por aqui, vai ser longo…como seu texto ! E vai dar outro livro…rsrsrsr!!!!
Um grande abraço !
Valéria.
Aline
22/07/2015 at 17:26Oi Rita, linda sua história, descobri a perda auditiva do meu filho a menos de um mês, os sentimentos estão a flor da pele ainda, ainda bem que vc compartilhou sua história conosco, me deu uma força tremenda, obrigada, bjs….
Rita
23/07/2015 at 15:39Puxa, Aline, fico feliz que essa história tenha vindo em um bom momento… sei que é fácil falar e difícil de enfrentar, mas seja forte e tenha esperança! Ao menos aqui vc pode encontrar muitas informações, pode conversar com as pessoas que passaram por isso… se você quiser e eu puder lhe ser útil, podemos compartilhar outras informações a mais… bjs!
Samira
21/07/2015 at 12:38obs: reflexões positivas e construtivas. 🙂
Ana Cláudia Rufino
21/07/2015 at 12:28Rita, que história bacana! Narrando todos os percalços que passou, a fibra que teve para superar as diversidades. A história com sua fonoaudióloga é muito sensível e bonita.
Olha, você ganhou uma admiradora viu!
Sinceramente, sua história inspirou a contar a minha também. Lembrei de tantas coisas chatas, mas lembrei também de superações. De coisas que somente quem tem deficiência auditiva, que passou na pele é que sabe o preço que se paga.
Que você seja muito feliz. Um forte abraço,
Ana Cláudia.
Rita
23/07/2015 at 15:35Oi, Ana Cláudia… sim, a minha fono foi uma linda pessoa… sempre penso nela! E qual é a sua história? Gostaria muito de lê-la… bjss
Samira
21/07/2015 at 10:20Eu tenho o pensamento: os pais dão aquilo que eles tem de melhor. Faço referência e honra a isto. Depoimentos como o seu, Rita, trazem reflexões. Partilha e conhecimento ajudam em tomadas de decisões, mais assertivas; tanto para quem tem a deficiência auditiva, como para os pais, familiares, profissionais da saúde e da educação.
Negação, sofrimento, menos-valia, todos podem passar; agora, a intensidade, e o tempo que fica-se nesta tríade, depende de cada um.
Bom dia a todos!
Gi
21/07/2015 at 10:16Bom dia, Rita! Bom dia a todos!
Cara Rita, saiba que eu tb me emocionei com dezenas histórias de vencedores que leio neste blog. Com o seu depoimento, não foi diferente.
Acho que todos temos muito a aprender em cada acontecimento em nossas vidas.
Não sou deficiente auditiva, mas meu noivo é surdo. Gosto de acompanhar este blog para compreender mais do mundo dele.
Já pratico alguns de seus conselhos. Eu me policiarei para seguir os demais.
Parabéns pela sua história vitoriosa! Que venham outras vitórias e mais felicidades em sua vida! Um abraço!
Rita
23/07/2015 at 15:26Obrigada! Que venham vitórias e mais felicidades em sua vida também! Entender o mundo de seu noivo já demonstra o seu amor por ele, e essas coisas me emocionam também. Já escreveu algum depoimento aqui? Gostaria de conhecer mais sobre sua história, sobre seu noivo… bjs!
Ines Martins
21/07/2015 at 10:16Que lindo seu depoimento! Parabéns Rita, você é uma vencedora!
Barbara
20/07/2015 at 19:02Rita, que coragem a sua de contar sua história! Adorei! Parabéns! Vou tentar seguir seus conselhos e lembrá-los sempre. Beijão
Rita
23/07/2015 at 02:56Barbara, e eu adorei o seu tumblr… a galera sempre pergunta se eu sou mineira… rsrs
Barbara
27/07/2015 at 12:55Já me perguntaram isso também! hahahaha Que bom que gostou do tumblr! 🙂