Há alguns dias estive no local da foto que ilustra este post, em Monterey, na Califórnia. Meu quarto tinha exatamente essa vista, o que me fez voltar no tempo para outubro de 2013, época em que eu estava aguardando a ativação do meu primeiro implante coclear. Na primeira cirurgia precisei esperar nada menos do que 47 longos dias até ativar, bem como enfrentei o pior zumbido da minha vida ao mesmo tempo em que precisava segurar todas as minhas expectativas. O resultado? Quase tive um colapso nervoso.
Lembro direitinho do dia em que implorei ao meu irmão que fosse comigo ficar ‘fora da área de cobertura‘ por uns dias. Pegamos o carro e fomos ao Uruguai, numa cidadezinha charmosa chamada Carmelo. Reservei um quarto no hotel Casa Chic, em Médanos de Punta Gorda, e ao chegar em Monterey, na California, meu pensamento foi um só: “Parece que estou em Carmelo outra vez! Mas tem algo diferente aqui!“
O som do mar
A diferença era essa, pois o cenário era quase igual: em Carmelo, o barulho do Rio da Prata; em Monterey, o som do mar. Só que o barulho do rio eu nunca ouvi. Precisei me contentar em olhar para a paisagem e imaginar como seria voltar a ouvir o som da água. Nas noites que passamos no Uruguai, passei longas e longas horas olhando para as estrelas e pedindo aos céus para ter tomado a decisão certa.
Só fui relembrar o som do mar na praia de Capão da Canoa, em janeiro de 2014, quando decidi ir até a Plataforma sozinha para descobrir se esse som também havia voltado a fazer parte da minha vida. E sim, ele havia. Eu tremia de nervoso ao ouvir as ondas com aquele primeiro mapa do implante coclear que, se comparado ao meu atual, não era nada. Felicidade pura, início de uma nova jornada…
Dizem que as nossas memórias ficam muito bem guardadas quando envolvem emoção, e talvez por isso é que meu coração tenha acelerado quando me deparei com a vista do quarto de hotel em Monterey. Ali, voltei a Carmelo, voltei aos medos daquela Paula que vivia presa na surdez profunda, voltei ao zumbido incessante e enlouquecedor, voltei à vida ultra solitária que levava, voltei aos pânicos com os quais convivia, voltei a sentir a dor de ser só eu-comigo-mesma.
E doeu.
Sei que, de muitos modos, ainda sou aquela Paula. Mas também sei que, de vários outros modos, não tenho mais nada dela. Perdi a grande maioria dos meus pânicos, não convivo mais com zumbido incessante e muito menos enlouquecedor, não sou mais solitária e não vivo mais presa no silêncio. Fico pensando se a ‘taquicardia’ momentânea foi obra do meu corpo e minha alma me dizendo que não querem nem pensar na possibilidade de que eu volte a ser aquela pessoa.
Voltar a ouvir me fez crescer, amadurecer, curar algumas feridas e gostar mais da vida. E o som do mar tem uma ligação intensa com isso tudo, pois foi o primeiro som que me fez dar um mergulho nas profundezas do meu ser. 🙂
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