Cheguei em Paris na sexta-feira. Luciano veio para o IFOS 2017 e eu vim acompanhá-lo e passear. Logo na chegada, no aeroporto Charles de Gaulle, já comecei a perceber os avisos de acessibilidade, sendo que o primeiro deles foi um adesivo enorme em frente à esteira de bagagem, mostrando que aquele local dava prioridade a pessoas com deficiência.
Eu estou perdidamente apaixonada pelo Aro Magnético, então fico de olho em todos os lugares que possuem esse recurso maravilhoso de acessibilidade, e muitos locais públicos como museus, teatros, Centre Pompidou, Maison Victor Hugo e até algumas igrejas possuem. Em geral, apenas na área de atendimento e venda de ingressos, mas ainda assim ajuda muito – eu não falo francês e entender um francês tentando falar em inglês dá nervoso, hehehe. Nessas horas, uma ajuda extra da tecnologia ajuda demais!
Sinto MUITA falta de aro magnético no balcão de atendimentos dos hotéis e sonho com o dia em que isso se tornará uma coisa banal. Muitos hóspedes são idosos que usam aparelhos auditivos e isso ajudaria a gente num grau imenso. Já passou da hora da indústria do turismo prestar mais atenção aos consumidores que usam aparelho auditivo e implante coclear, não acham? Sempre que viajo penso nisso: a recepção não é acessível a nós, os quartos não são acessíveis a nós…Se pelo menos um quarto fosse, já estaria de bom tamanho.
Quando venho a Paris minha primeira parada é sempre a Igreja da Medalha Milagrosa. Tenho um carinho muito especial por este lugar, quem leu o meu segundo livro sabe o motivo. Toda vez que vou lá me sinto tão em paz e entro num estado meditativo tão profundo que desando a chorar. Choro muito mesmo, de lavar a alma. Não foi diferente nesta vinda…
Eu estava rezando, meu cabelo estava preso e meus IC’s por cima dele. Uma missa havia acabado de terminar e as pessoas estavam fazendo muito barulho, então simplesmente tirei as antenas para poder rezar em silêncio. Um rio de lágrimas tomou conta de mim enquanto eu pensava na minha mãe e no quanto me sinto sozinha sem ela no mundo. De repente, uma pessoa me cutuca no banco de trás, e quando olho, era uma senhora de cabelo branquinho e olhos azuis que parecia um anjo. Ela me mostrou o celular com uma foto de uma criança que estava usando um implante coclear.
Ela veio e sentou-se ao meu lado, e começamos a tentar conversar. Quando eu disse que era brasileira, me pegou pela mão e me levou para conhecer a irmã Rita, uma brasileira muito querida que vive e trabalha na Igreja da Medalha Milagrosa. Irmã Rita brincou comigo dizendo que acha que em breve precisará de um implante. Como eu não conseguia parar de chorar, ela me olhou e disse: “É para ficar feliz! Você está viva, você está aqui. Seja grata por isso!”. Era a injeção de ânimo que eu precisava naquele momento. Maria Pilar, a senhora que me cutucou, tem uma sobrinha-neta usuária de IC na Espanha. Já ficamos amigas no Facebook e vi que ela compartilhou a nossa foto falando que este encontro foi uma bênção.
Para mim, foi um sinal. Eu adoro sinais e eles me perseguem – estou sempre com os olhos e os ouvidos bem atentos! 🙂
Passeando pelo Marais, entrei na BHV e fui dar uma olhada no setor de papelaria. Encontrei uns adesivos novos para os IC’s e comprei porque tinham a ver com música e eram dourados. Aproveito para deixar uma dica legal: comprei adesivos com pequenas letrinhas brancas e pus meu nome na parte de dentro do processador com elas. Assim, se vier a perdê-lo, a pessoa que encontrar lê e me acha no Google. Depois que coloquei fiquei pensando que o mais inteligente mesmo é fazer uma informação num papel contact com nome + telefone + email e colocar na parte de trás de todas as baterias e dos processadores. Prevenir é melhor que remediar, no nosso caso, perder um IC é uma brincadeirinha na casa dos R$40.000…
PS: gostaram do meu brinco em formato de cóclea?
Fui a pé ao Museu Rodin e, no caminho, me deliciei demais com o barulho que o vento fazia ao bater nas folhas das árvores na rua. As árvores de Paris têm um barulho lindo quando bate um ventinho, e prestar atenção nisso é o tipo de facada no coração que faz bem pra alma.
A última vez em que estive num museu em Paris foi em 2012, e quando perguntei se pessoa com deficiência auditiva tinha algum desconto na compra do ingresso, o funcionário pegou eu e minha avó e nos levou até uma entrada especial e explicou que PCD e um acompanhante têm entrada gratuita – aqui tem post de 2012 sobre isso. Fiquei com aquilo na cabeça e, como li em vários lugares sobre isso, cheguei ao Museu Rodin achando que lá seria igual, mas me enganei. A funcionária explicou que somente quem tem uma tal de Carte Française tem direito, mas entrei no site e vi que eles aceitam vários documentos de identificação, só que todos franceses. Vejam:
Les personnes handicapées civiles ou militaires et leur accompagnateur
Sur présentation d’une carte d’invalidité délivrées par une MDPH (maison départementale des personnes handicapées) et CDAPH (commission des droits et de l’autonomie des personnes handicapées) en cours de validité, d’une carte de l’ONAC (office des anciens combattants) accompagnée d’une pièce d’identité avec photographie, d’un justificatif AAH (allocation pour adultes handicapés), d’un justificatif ASI (allocation supplémentaire d’invalidité), d’un justificatif PCH (prestation de compensation du handicap), d’un justificatif RTH (reconnaissance de travailleur handicapé).
Aliás, acabei de entrar no site da Maison Victor Hugo e descobri que, além do aro magnético, em um sábado do mês eles fazem visitas guiadas com leitura labial, olha que bacana! Além disso, em vez de audioguia eles têm um vídeo-guia. Acessibilidade gente, tem coisa mais maravilhosa do que isso? Tem não…
Depois conto com mais detalhes, mas antes de vir a Márcia Cavadas e a Márcia Kimura deram uma mexida no meu mapeamento e fizeram uma opção em que o Scan do N6 me permite ouvir muitos barulhos que antes não permitia. Estou adorando usar esse mapa no ouvido esquerdo, enquanto deixo o direito com o mapa normal. As cidades são muito barulhentas, nossa! Ao mesmo tempo em que é maravilhoso ter a opção de ficar off desse barulho todo focando na voz das pessoas e nos sons que são gostosos de ouvir, fiz esse pedido porque tenho passado por várias situações no Rio de Janeiro em que o Scan não me deixa ouvir quando vem carro ou bicicleta atrás de mim e quase me atropelam. Morro de medo de ser atropelada, e como fico zanzando por aí sozinha em viagens, achei que era hora de resolver isso. Foi uma super ajuda! Quando um aparelho decide sozinho o que você vai ouvir, pode te colocar em situações de risco. Agora tenho um mapa que chamo de ‘mapa da segurança’.
De resto, Paris continua linda e Saint Germain des Près e Marais continuam sendo meus bairros favoritos! Tenho caminhado pelo menos 10km todos os dias. Fico hoje e amanhã e volto ao Brasil na quinta-feira. Ah, sempre de olho nos ouvidos alheios, vi muuuitos aparelhos auditivos mas por enquanto apenas um implante coclear.
Grupo SURDOS QUE OUVEM
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3 Comments
Vanessa de Oliveira
28/06/2017 at 11:23Continue compartilhando suas aventuras conosco sempre que puder. É uma injeção de ânimo toda a informação que você nos passa por aqui. Sou usuária nova de AASI e foi o seu blog que me deu coragem para enfrentar essa nova empreitada e, mais que isso, me deu mais autonomia e esperança, porque me deu acesso à informações que eu precisava e não tinha ideia que existia. Você nos motiva e não sei se tem ideia do bem danado que nos faz. Obrigada por tornar “nosso mundo” mais acessível!
Kátia
27/06/2017 at 12:23Paula, obrigada por suas histórias. Me delicio com cada uma. Compartilho suas vivências e aprendizado.
Você tem algum posts especificamente sobre os aros magnéticos? Ainda não entendi muito bem como funcionam. Obrigada
Paula Pfeifer Moreira
02/07/2017 at 08:38Oi Katia, sim: https://cronicasdasurdez.com/aparelho-auditivo-compativel-com-aro-magnetico/
bjos