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Crônicas da Surdez / Maternidade

A SURDEZ em CRIANÇAS é urgência NEUROLÓGICA

A surdez na infância pode deixar feridas que nunca cicatrizam, e a gente só entende isso quando se torna adulto e continua enfrentando certos fantasmas não resolvidos da surdez. Comecei a perder a audição na infância, e agora que sou uma surda que ouve adulta, às vezes me pego pensando na falta de acolhimento e conversas francas sobre a deficiência auditiva que me fizeram tanta falta quando eu era criança. Começo esse post com um apelo aos pais e mães de crianças com algum grau de surdez: tenham as conversas difíceis e necessárias com os seus filhos desde muito cedo! Isso faz TODA diferença na vida deles.

A surdez em CRIANÇAS

A surdez em crianças é uma URGÊNCIA MÉDICA, uma urgência de cunho neurológico. O cérebro humano precisa de acesso a todos os SONS para poder se desenvolver e, principalmente, adquirir uma linguagem. Toda criança deve passar pelo teste da orelhinha e fazer uma audiometria 1x por ano. Isso deve ser levado MUITO a sério, pois crianças pequenas não têm como explicar aos pais que não estão ouvindo ou que estão perdendo a audição. E a surdez nos anos iniciais, idade de aquisição de fala e linguagem, deve ser rapidamente diagnosticada e tratada. Surdez tem tratamento, e tudo começa por um médico otorrino especialista em surdez. Saúde auditiva é saúde cerebral e desenvolvimento correto.

O desconhecimento geral da população a respeito da surdez tem um grande impacto no modo como as famílias lidam com o diagnóstico de perda auditiva em bebês e crianças. Os pais entram em pânico ao descobrir que o filho tem deficiência auditiva. Muitas vezes, a falta de acolhimento e de acesso à informação de qualidade faz com que esses pais e mães se fechem e transformem o assunto surdez num grande tabu dentro de casa e no seio da família inteira. E isso é péssimo para os pequenos. Eles precisam entender sua diferença, aprender autoadvocacia e perceber claramente que são amados e aceitos do como são pelos seus pais.
Por que estou falando dos pais? Porque eles são as grandes referências dos filhos surdos. A evolução e a autoestima de uma criança surda estão intrinsecamente ligados ao envolvimento dos pais na jornada da surdez. E quando esses pais estão fragilizados, sofrendo, perdidos e não buscam ajuda, a chance de que as consequências psicológicas disso impactem negativamente a vida dos seus filhos é altíssima. É a respeito disso que quero falar hoje.
Tudo começou com uma caixinha de perguntas que abri no Instagram perguntando: “O que você diria HOJE para a criança surda que você foi?“. As respostas me impactaram com força. Voltei a ser criança lendo cada uma delas e reencontrei um monte de sentimentos confusos que eu sequer era capaz de nomear ou entender minimamente naquela época. Vou compartilhar entre aspas algumas das respostas e comentá-las, para que vocês possam entender.

“Vai no otorirno fazer um exame. Você não entende tudo o que ouve”

Minha mãe sabia que eu não escutava normalmente mas evitava o assunto. Nunca tive chance de perguntar a ela porque isso era algo que a machucava tanto, afinal, a tendência de qualquer ser humano é evitar aquilo que causa dor. Se eu não tivesse dado um basta aos 16 anos e exigido que me levassem a um otorrino especialista em surdez, não sei o que teria sido de mim. Portanto, se você desconfia de uma perda auditiva no seu bebê ou criança, corra para um otorrino especialista em surdez. Se você já recebeu o diagnóstico, você não tem o direito de ficar paralisado em luto e desespero, porque o relógio está correndo contra vocês e o cérebro do seu pequeno precisa desesperadamente de estímulo.

“Você não é burra, você só não escuta bem”

Eu cresci sem saber que estava perdendo a audição. Quer dizer, lá no fundo, eu sentia e sabia, mas meu problema não tinha um nome e isso me causava uma confusão de sentimentos. Às vezes eu achava que era burra. Às vezes eu achava que era lenta demais porque tudo parecia tão fácil e rápido para os meus amigos e colegas. Às vezes eu achava que jamais entenderia qualquer coisa sobre matemática porque perdia as explicações e depois não tinha quem me ensinasse em casa. Não conversar sobre a surdez durante a infância de uma criança surda é uma das piores coisas que os pais podem fazer. A vida real não perdoa. Você acha que está protegendo o seu filho ao fazer isso mas, na verdade, você está fazendo com que ele se veja completamente exposto, vulnerável e fragilizado quando as situações inesperadas acontecerem. E elas vão acontecer.

“Não se preocupe com a opinião alheia, você vai inspirar outras pessoas”

Quando entrei na faculdade, aos 18 anos, comecei a sentir uma vontade louca de sair do armário da surdez. Eu morava numa cidade pequena, no interior do Rio Grande do Sul. Passei a escrever artigos de opinião sobre surdez para o jornal local, e todos eles foram publicados. Minha mãe me perguntava: “Para que se expor desse jeito?”. À medida que fui me fortalecendo, eu dizia: “Por que não?”. Estimule as conversas francas sobre surdez dentro da sua casa. Faça perguntas difíceis para o seu filho, tenha as conversas difíceis com o seu filho sobre a deficiência sensorial dele, antecipe as coisas que podem acontecer e mostre qual é a maneira inteligente de reagir a cada uma delas. A surdez na infância, quando é naturalizada, torna a surdez na vida adulta muito mais leve.

“Quebra esse armário e vai ser feliz!”

Minha mãe foi minha grande cúmplice e incentivadora do armário da surdez. Quando eu me arrumava para ir a uma festa, ela dizia: “Tira esse aparelho pra sair, você está tão bonita e arrumada, não precisa disso na festa”. Não me entendam mal: minha mãe morreu em 2016 e até hoje eu estou no processo de compreender uma série de coisas a respeito de inúmeras escolhas que ela fez na vida. Não é uma filha “atacando e julgando” a mãe, mas sim uma adulta que poderia ter tido uma infância MUITO DIFERENTE em relação à surdez se a sua mãe tivesse buscado ajuda psicológica, contato com outras mães de crianças surdas e aprendido sobre deficiência auditiva para me ajudar a trilhar esse caminho com mais leveza. Se você engasga quando alguém chama seu filho de surdo, se você esconde as próteses auditivas do seu bebê ou criança, se você reza por milagres e foge da reabilitação auditiva, entenda: você precisa DESESPERADAMENTE sair desse luto e se fortalecer. Ou então comece a pensar no que irá responder quando seu filho for adulto e lhe perguntar: “Por que você fez isso?”.

“Se acalma! Vem cá que vou te dar um abraço,  e lá na frente tudo vai dar certo!”

A época mais sofrida para mim foi quando cheguei ao segundo grau e precisei começar a pensar sobre qual profissão iria escolher. Eu estava ficando cada vez mais surda, a surdez ainda era um enorme tabu dentro de casa, eu não conversava com ninguém sobre isso. Tive que pesquisar sozinha, escolher opções sozinha, decidir sozinha. Foi tão solitário! Eu lembro quando falei que queria cursar jornalismo ou direito porque meu sonho era ser diplomata, mas que tinha que ser realista e ir para um curso no qual não precisasse ouvir. Ninguém da família me encorajou a perseguir meu sonho, ninguém tentou me dissuadir de ir pelo caminho mais fácil. Simplesmente fizeram um semblante de condescendência misturado com pena, passando a mensagem de que eu estava certa naquela decisão – que foi uma das PIORES que já tomei na vida. A surdez na infância, quando bem trabalhada e bem conversada, amplia os horizontes e as possibilidades daquela criança surda. Pais que buscam informação sobre tudo o que está relacionado a esse universo – especialmente a questão dos direitos dos surdos e da acessibilidade para surdos oralizados – ampliam exponencialmente as possibilidades educacionais e profissionais dos seus filhos. Eu só fui descobrir a força que tinha quando voltei a ouvir, aos 32 anos. Teria sido maravilhoso ter tido pais que conversassem abertamente comigo sobre como dar um jeito de contornar as limitações que a deficiência auditiva impunha na minha vida.

“Você é capaz. Você consegue. Não tenha vergonha da sua surdez e seja corajosa, o mundo é seu!”

Às vezes fico um pouco triste pensando em como minha vida poderia ter sido diferente se eu tivesse ficado sabendo da minha deficiência bem pequena, logo quando ela apareceu. Talvez eu tivesse começado a usar aparelhos auditivos cedo e todos os perrengues que enfrentei (não ouvir, não entender, virar motivo de piada, ser chamada de surda aos berros por colegas, ser considerada sonsa e desatenta por professores, ter passado anos preciosos da minha juventude apavorada e me sentindo um lixo no armário da surdez, etc) não tivessem acontecido. Se os adultos ao meu redor tivessem se fortalecido e encarado o problema de frente, sem medo, sem tabus, sem fugas, teriam tido os recursos necessários para me fortalecer também. Mas aí logo penso: as coisas são como são, e se nada disso tivesse acontecido, o Crônicas da Surdez não existiria e eu jamais teria tido a chance de ajudar tanta gente como venho fazendo desde 2010, quando ele nasceu. Há males que vêm para o bem, e esse foi um deles. A vida (ou seria Deus) tem formas curiosas de nos conduzir por caminhos tortos até o topo da montanha. Talvez seja isso que nos faça chegar lá em cima e apreciar a vista com outros olhos. E outros ouvidos também!

MEU FILHO NÃO ESCUTA: o que os pais e mães podem fazer?

Aqui está um passo-a-passo básico para o início da jornada da surdez:
  1. Busque um otorrino especialista em surdez
  2. Busque um fonoaudiólogo especialista em surdez
  3. Busque uma rede de apoio para mães de crianças com deficiência auditiva
  4. Leia livros sobre surdez escrito por pessoas surdas
  5. Leia sobre capacitismo e surdez
  6. Busque ajuda psicológica e faça terapia
  7. Não transforme a surdez da sua criança num TABU
  8. Naturalize o uso de aparelhos auditivos e implante coclear
  9. Tenha todas as conversas difíceis que forem necessárias com o seu filho desde a infância
  10. Ensine ao seu filho TUDO a respeito da deficiência sensorial que ele tem

 

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grupo de surdos que ouvem deficiência auditiva surdez

A sua jornada da surdez não precisa ser solitária e desinformada! Para que ela seja mais leve, simples e cheia de amigos, torne-se MEMBRO do Clube dos Surdos Que Ouvem. No Clube, você terá acesso às nossas comunidades digitais (grupos no Facebook, Whatsapp e no Telegram), conteúdos exclusivos, descontos em produtos e acesso aos nossos cursos*.

São 21.700 usuários de aparelhos auditivos e implante coclear com os mais diferentes tipos e graus de surdez para você conversar e tirar suas dúvidas a respeito do universo da deficiência auditiva (direitos, aparelhos, médicos, fonos, implante, concursos, etc).

MOTIVOS para entrar para o Clube dos Surdos Que Ouvem:

  1. Estar em contato direto com quem já passou pelo que você está passando (isso faz toda a diferença!)
  2. Economizar milhares de reais na compra dos seus aparelhos auditivos
  3. Aprender a conseguir aparelho de audição gratuito pelo SUS
  4. Não cair em golpes (a internet está abarrotada de golpistas do zumbido, de aparelhos de surdez falsos e profissionais de saúde que não são especializados em perda auditiva!)
  5. Conversar com milhares de pessoas que têm surdez, otosclerose, síndromes e usam aparelhos para ouvir melhor
  6. Conhecer centenas de famílias de crianças com perda auditiva
  7. Fazer amigos, sair do isolamento e retomar sua qualidade de vida
  8. Pegar indicações de médico otorrino especialista em surdez e fonoaudiólogos do Brasil com pessoas de confiança

Se você for mãe ou pai de uma criança com perda auditiva, uma das comunidades digitais do Clube é um Grupo de Telegram com centenas de famílias se ajudando mutuamente todos os dias.

o melhor aparelho auditivo

Os erros que você NÃO PODE cometer ao comprar APARELHO AUDITIVO

Eu já passei pela saga da compra de aparelhos auditivos várias vezes. Já fui convencida a me endividar para comprar um aparelho auditivo “discreto e invisível” que sequer atendia a minha surdez. Já fui enganada ao levar um aparelho auditivo para o conserto na loja onde o comprei: a fonoaudióloga disse que ele não servia mais para mim sem sequer verificá-lo ou fazer uma nova audiometria. Já quase caí no conto do vigário de gastar uma fortuna num aparelho auditivo para surdez profunda “top de linha”, cujos recursos eu jamais poderia aproveitar devido à gravidade da minha surdez. Já fui pressionada a comprar um aparelho auditivo porque supostamente a “promoção imperdível” duraria apenas até o dia seguinte. E também quase cometi a burrada de comprar um aparelho de surdez que já estava quase saindo de linha por causa de um desconto estratosférico que ‘acabava amanhã’.

Mas VOCÊ não precisa passar por isso.

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About Author

Paula Pfeifer é uma surda que ouve com dois implantes cocleares. Ela é autora dos livros Crônicas da Surdez, Novas Crônicas da Surdez e Saia do Armário da Surdez e lidera a maior comunidade digital do Brasil de pessoas com perda auditiva que são usuárias de próteses auditivas.

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