A surdez é cansativa. Quem convive com ela sabe muito bem disso, e não importa o grau da perda auditiva ou se você usa aparelho auditivo, implante coclear ou não usa nada. É quase impossível não chegar ao final do dia cansado.
A surdez me lembra uma frase que eu costumava ouvir quando era pequena: ‘o trabalho mental cansa mais que o trabalho braçal‘. Como exige demais do nosso cérebro, é inevitável que a maioria de nós se sinta esgotado após um dia cheio.
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A surdez é CANSATIVA no dia a dia
A gente acorda e precisa buscar o som, pois ele não entra naturalmente. Até hoje os primeiros minutos do meu dia me fazem sentir como ‘ei, que barulheira é essa?‘ assim que coloco meus implantes cocleares após uma noite de sono no mais absoluto silêncio reconfortante.
Nos anos em que usei aparelho auditivo, lembro de já no meio da tarde me sentir cansada, em função da leitura labial ininterrupta – eu fazia atendimento ao público numa repartição pública, vejam só que ironia.
Cada nova boca era um novo mundo, cada dentadura mal colocada, um novo idioma; cada palavra mal articulada, uma sessão de tortura.
Chegava um momento em que os olhos convergiam e eu não conseguia mais focar em nada. Houve uma vez em que fui ao oftalmologista 4x seguidas, pois tinha certeza de que havia algum problema com a minha visão. Porém, não havia: era cansaço mental de um cérebro calejado de tanto precisar desvendar bocas.
A surdez é cansativa
A surdez é cansativa porque, além de exigir de nós um esforço monstruoso e incessante, também tem o dom de nos deixar nervosos.
Estamos inseridos em famílias nas quais todos falam ao mesmo tempo, esquecem das nossas dificuldades, não falam de frente para nós, não respeitam nossa necessidade de um pouco de silêncio, têm preguiça de repetir quando não escutamos.
Estamos inseridos em locais de trabalho com colegas insensíveis, falta de acessibilidade, bullying por causa das cotas, chefes despreparados para lidar conosco.
Estamos inseridos num mundo barulhento, com poluição sonora em todo e qualquer lugar, que exige respostas perfeitas na velocidade da luz.
Estamos inseridos em grupos de amigos que nem sempre têm a delicadeza necessária para lidar com a nossa deficiência auditiva e nos convidam para baladas escuras, restaurantes de 130dB e afins.
Estamos em relacionamentos com pessoas que ouvem, e poucas delas compreendem de verdade as dores e cansaços que a surdez nos traz.
Cuide da sua saúde mental
Temos o direito de nos proteger desse cansaço, tirando um tempo para nós, quando acharmos necessário. Fazendo com que os outros entendam que às vezes precisamos, SIM, de silêncio, de aparelhos desligados, de sossego.
Numa das tantas ironias da surdez, começamos o dia com pilhas físicas e emocionais carregadas, e chegamos ao final do dia com o aviso do “Pi Pi Pi” físico e emocional. Troque as pilhas físicas e recarregue as emocionais, pelo bem das novas situações auditiva que virão! 🙂
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22 Comments
Guia sobre Aparelho Auditivo para novatos - Crônicas da Surdez
13/10/2021 at 16:07[…] auditivo é um recurso utilizado para ajudar pessoas que possuem algum grau de surdez (deficiência auditiva). Ele não é um ouvido novo, mas sim uma ajuda para ouvir melhor. Portanto, […]
10 mitos sobre a surdez: você sabe quais são?
10/10/2021 at 23:02[…] são poucos os mitos sobre a surdez espalhados por aí até hoje! O senso comum acredita nas maiores barbaridades sobre esse assunto, […]
Maria Ema M. Rabeli
11/03/2017 at 03:23Adorei o texto. Mais tenho que confessar que tenho dificuldade de lidar com deficiente em geral. Sou muito estabanada e apressada naturalmente – esta é a minha deficiência -, já convivi com pessoas com deficiência auditivas.
Ouvi queixas de falta de paciência por parte de pessoas ‘normais’ mais é que às vezes eu esquecia que a pessoa era deficiente e saio atropelando, tipo assim, estou conversado com deficiente auditivo aí ou eu disparo a falar ou antes de terminar viro pra sair e continuo a falar esquecendo que a outra pessoa precisa ver o movimento da boca. Depois deste texto vi o tanto que devo parecer mal educada, insensível etc.. peço desculpa.
Maria Rosa
14/12/2016 at 22:40Paula, cada vez que leio seus posts vejo muito da minha história, e é tão bom saber que muitas situações são comuns pra quem tem perda auditiva, dá até um alívio…rs
Tenho otosclerose bilateral e zumbidos constantes, e o esforço para ouvir e entender realmente é demasiado cansativo, sem contar que minhas noites não são silenciosas, pois os zumbidos ficam mais perceptíveis quando tiro os aparelhos auditivos.
Paula Pfeifer Moreira
16/12/2016 at 12:02<3
tatiana
14/12/2016 at 11:14Bhaa… por isso que a minha visão dá uma “cegueira”… faz sentido isso. Usei trinta anos analógico e duas semanas estou tentando aceitar digital, mas está difícil a adaptação…. muito diferente os sons… dependendo o grau da surdez, não quer dizer q só servem analógico? pq eles insistem q eu use digital e eliminar analógico. Tenho surdez bilateral severa profunda.
Abel Estevam dos Santos
12/12/2016 at 22:53Eu os amo ainda mais, queridas pessoas surdas!
Cristina Marques Barbosa
12/12/2016 at 11:53Minha filha mais velha Cássia Rachel, 07 anos, tem perda auditiva bilateral neurosensorial, ainda não temos confirmação se é uma perda progressiva ou não, apenas nesse ano tivemos esse diagnóstico. Observo esse cansaço nela, o quanto ela se esforça na leitura labial. Na escola, na vida social em geral. Mas luto por uma melhoria na vida dela. Hoje ela está usando aparelho auditivo há 05 dias, fizemos rifas, vendas de lanche, recebemos doações e conseguimos a aquisição do mesmo. Mas não vou parar aí!!! Vou em frente por uma vida mais digna e acessível para ela. Obrigada por compartilhar sua história conosco!!!!
Paula Pfeifer Moreira
12/12/2016 at 18:12Cristina, em que cidade vcs estão?
Paula Pfeifer Moreira
16/12/2016 at 12:02Em que cidade vcs moram?
Edson M. Tsuhako
09/12/2016 at 15:25Tenho perda auditiva bilateral profunda desde os sete anos e sei como é isso. Na escola, voltava esgotado depois das aulas. Na faculdade, levava xingo de alguns professores por sentir muito sono (depois de fazer um esforço sobre humano para acompanhar as aulas). E, atualmente, no trabalho, não é diferente. Em festas, então, é muito cansativo acompanhar uma conversa no meio de tanto barulho. Para quem não nos entende, é falta de dormirmos cedo rsrsrs.
ERICA
09/12/2016 at 14:53Nossa você descreveu tudo o que tenho vivido,tenho tendado achar resposta para o meu cansaço, e agora faz sentido. Eu desde os 20 anos percebi uma dificuldade em ouvir de longe, mas relevei, lutei contra mim não queria aceitar que estava tendo perda auditiva, mas o tempo foi passando a perda que aparentemente era pequena foi aumentando e ate que a um ano atras eu resolvi procurar tratamento, minha família e amigos já não tinham paciência para falar e nem repetir tantas vezes as coisas pra mim. E para minha surpresa eu tenho Osteosclerose auditiva, a 6 meses estou usando aparelho, o Zumbido no ouvido tem só aumentado, tem dia que parece que vai me deixar louca, para dormir então meu deus. E infelizmente a sociedade, nosso circulo familiar não estão preparados para lidar com nossa deficiência. Já ouvi inúmeras vezes. VOCÊ É SURDA, ESTA ESCUTANDO NÃO. ou HÁ VOU REPETIR NÃO VC È SURDA, OU TA VELHA ENTÃO, FICANDO SURDA. No momento me mantinha firma mas já chorei muito ao chegar em casa. Ainda não superei a forma que as pessoas me olham, é uma deficiência e não uma doença contagiosa, sou normal como todo mundo, mas as piadas as vezes machucam….
Maria Luiza Campos
08/12/2016 at 17:54O silêncio sempre se fez presente. Em todos os momentos, lugares, desde meus primeiros anos, como um companheiro fiel. É como uma lembrança para alegria e para tristeza. Mas também um refúgio para pensamentos (e paz). Me sinto bem assim.
Paula Pfeifer Moreira
16/12/2016 at 12:47O silêncio é um refúgio para todos nós!
:*
Brenna vitoria
09/08/2022 at 12:54Simmm verdade mesmo concordo com você melhor coisa que a gente fazer e fica no silêncio
Marcia Valeria Costa
08/12/2016 at 16:55Com certeza é bem assim mesmo,me sinto cansada e frustada no fim do dia,como já relatei anteriormente sou surda bilateral , a falta de paciência é uma constante,tem momento que fico tonta,quando muitos falam ao mesmo tempo,ultimamente gosto muito de ficar sozinha.
michelle bonnamain
08/12/2016 at 16:43Lindo texto,mas o que me deixa ainda mais incomodada são pelo simples fatos dos colegas de trabalho não medir esforços em fazer bulling da falta de audição ou ser forçada a trabalhar lidando com um público que muitas vezes é mal educado e grosseiro quando pedimos para repetir e que o aparelho auditivo fica apitando e falhando,no fim do dia estou assim,triste e cansada.
Paula Pfeifer Moreira
16/12/2016 at 12:04Eu pedi pra sair do atendimento ao público na época em que usava aparelhos auditivos.
Porque vc também nao pede?
isis
08/12/2016 at 14:46adorei… percebo meu filho há seis anos e acho que é bem isso . Mesmo para as crianças.
Obrigada por compartilhar a sua visão… isso nos ajuda a entender nossos filhos
bjs
Paula Pfeifer Moreira
16/12/2016 at 12:03Qualquer ajuda que precisar, é só falar.
beijos
Sabrina
08/12/2016 at 12:40Cada palavrinha escrita neste artigo descreve exatamente o que vivi antes de começar a usar os aparelhos auditivos. Constrangimentos, chacotinhas, abusos do tipo que a pessoa fala uma coisa e depois desfala com a desculpa de que entendi errado por causa do problema com a audição, falta de compreensão até por parte da “família”, etc… Na verdade ainda passo por algumas das situações descritas, mas não como antes… e a minha qualidade de vida só tem melhorado graças a Deus. Parabéns pelo blog! ??????
Paula Pfeifer Moreira
16/12/2016 at 12:03Obrigada, Sabrina!! 🙂